É possível roubar Música?

É possível roubar música?

"Pode-se falar eventualmente de utilização sem autorização, mas não de roubo." Veja entrevista do prof. Pedro Paranaguá sobre Internet, liberdade de expressão e propriedade intelectual para o Instituto Humanitas Unisinos (IHU):

Direitos autorais são bens não-escassos. Entrevista especial com Pedro Paranaguá - 07/12/2009

“Direito autoral não é uma propriedade tradicional. Direito autoral é composto por bens não-rivais. Ou seja, ao contrário da propriedade material, tradicional, o meu uso, usufruto ou gozo, não exclui o uso de outros”, afirma o professor Pedro Paranaguá, em entrevista concedida, por e-mail, à IHU On-Line.

Ele continua explicando: “Direitos autorais deveriam ser tratados de forma diferente da propriedade material tradicional. Não tem como falar em roubo de algo imaterial. Roubo de uma música. Pode-se falar eventualmente de utilização sem autorização, mas não de roubo. Por quê? Porque roubo ou furto implica a subtração de algo, de outra pessoa. No direito autoral, o autor ou o titular da obra continua tendo o bem, afinal é um bem não-rival”. Afinal, segue ele, “os direitos autorais servem para incentivar a criatividade e a disseminação de entretenimento e cultura. Não o controle. Portanto, temos de pensar se os direitos autorais têm servido para esses fins (criação e disseminação) ou se têm sido utilizados para manter o status quo e o modelo de negócio de poucos (porém poderosos). Parece ser necessário um maior equilíbrio, com remuneração não apenas à indústria autoral, mas também aos autores, bem como uma efetiva disseminação cultural e benefício para os consumidores finais”. E dispara: “A liberdade de expressão é condição essencial para uma sociedade livre, igualitária e rica culturalmente. No momento em que leis de direitos autorais passam a limitar tais expressões, algo está errado”.

Pedro Paranaguá é mestre em direito da propriedade intelectual pela Universidade de Londres e doutorando na mesma área na Universidade de Duke, Estados Unidos. É professor da Fundação Getulio Vargas - FGV-Rio e co-autor dos livros Direitos Autorais (Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009) e Patentes e Criações Industriais (Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009).

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Qual sua opinião sobre o compartilhamento de arquivos pela Internet? Que comportamento social essa iniciativa evidencia?

Pedro Paranaguá - O compartilhamento via redes peer-to-peer (P2P) é uma tecnologia incrível para a troca de arquivos. É muito eficiente e muito mais rápida. Isso encurta as distâncias e elimina consideravelmente custos na distribuição. Elimina, junto, o papel de intermediários (distribuidores). As redes P2P nasceram no meio acadêmico, para troca de pesquisas científicas. Hoje, como todos sabem, é muito utilizada também para troca de arquivos protegidos por direitos autorais. Por um lado, pode gerar dor de cabeça para a indústria do conteúdo, afinal de contas, ameaça o tradicional modelo de negócio da indústria do entretenimento. Por outro lado, é um inegável avanço tecnológico, além de gerar bem estar social, conforme comprovado empiricamente por recentes pesquisas econômicas da Universidade de Maastricht, bem como em outro estudo independente feito por encomenda do governo holandês.

IHU On-Line - O que muda em relação ao conceito de propriedade e de direito autoral com as novas tecnologias e com a Internet?

Pedro Paranaguá - Esta questão é importantíssima. Por isso começo com uma historinha para ilustrar: se temos um celular e duas pessoas, enquanto uma delas utiliza o celular, a outra não pode usá-lo, tem de aguardar. Se temos a música Stairway to Heaven e duas pessoas (ou mil pessoas), elas poderão escutar a música ao mesmo tempo (ainda que em lugares ou até mesmo países diferentes). O que isso significa? Que direito autoral não é uma propriedade tradicional. Direito autoral é composto por bens não-rivais. Ou seja, ao contrário da propriedade material, tradicional, o meu uso, usufruto ou gozo, não exclui o uso de outros. Tal como no caso do celular. Além disso, direitos autorais são bens não-escassos. Ou seja: o uso contínuo do bem não o diminui, não o desgasta. Portanto, direitos autorais deveriam ser tratados de forma diferente da propriedade material tradicional. Não tem como falar em roubo de algo imaterial. Roubo de uma música. Pode-se falar eventualmente de utilização sem autorização, mas não de roubo. Por quê? Porque roubo ou furto implica a subtração de algo, de outra pessoa. No direito autoral, o autor ou o titular da obra continua tendo o bem, afinal é um bem não-rival. Além disso, você nunca vai perder a propriedade do seu celular, do seu carro ou da sua casa depois de X anos. Já o direito autoral, apesar das várias extensões recentes, tem prazo limitado, o que a propriedade tradicional não tem. A suprema corte alemã, acertadamente, entende que direitos autorais não são uma propriedade tradicional, mas sim um tipo (diferente) de propriedade. As novas tecnologias evidenciaram mais ainda esses fatores de não-rivalidade e não-escassez. O mundo digital mostra que uma cópia ou mil cópias podem ser idênticas, muito baratas e, ainda por cima, não exclui o uso de terceiros.

IHU On-Line - Qual sua visão sobre a pirataria e como ela se contrapõe à questão da propriedade intelectual?

Pedro Paranaguá - Eu prefiro o termo cópia não autorizada. O termo "pirataria" tem cunho emocional e ideológico muito fortes. Remete aos saqueadores (às vezes sanguinários) que eram financiados pela coroa inglesa para subtrair bens de nações vizinhas. Como eu disse acima, a cópia de uma música, ainda que não autorizada, por exemplo, não constitui subtração, portanto, não é roubo ou furto, no sentido estrito da palavra. Não estou, em hipótese alguma, incentivando a cópia ilegal. Mas é preciso diferenciar a retórica propagandista dos fatos reais. Não creio que a cópia não autorizada se contraponha, necessariamente, aos direitos autorais.......


Entrevista com Prof. Pedro Paranaguá
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